quarta-feira, outubro 04, 2006

"Do Outro Lado"

“Do Outro Lado

Eleições 2006. Vota Brasil. Da minha perspectiva, até que a relação de votantes por metro quadrado se assemelhava com a distribuição populacional do país. Afinal, eram no total 324 votantes em uma única seção, instalada em uma sala de aula dentro de um famoso colégio no bairro do Morumbi.

A cartinha, datada de final de julho, foi recebida na segunda semana de agosto. Nela, indicava um prazo de cinco dias úteis para recorrer da convocação de mesário. Ainda que tentasse recurso, deveria ter um motivo bastante convincente para me livrar do dever cívico de auxiliar nas eleições.

No começo fiquei um tanto irritado e relutante com a idéia, mas com o tempo fui me adaptando ao fato de, em pleno domingo, ficar em uma sala de aula das 7:00 até as 17:30, assistindo algumas passagens ao menos interessantes.

Após conhecer minhas outras quatro companheiras de mesa, onde cada um tinha sua hierarquia, cumprimos um tradicional rito de curiosidade impulsiva: abrimos os dois livros em buscas de nomes diferentes ou conhecidos. Entre os achados, uma verdura, uma cerveja, dois sobrenomes de políticos, um sobrenome do campo da publicidade e mais um do ramo de medições industriais.

Mais intrigantes do que os nomes, algumas pessoas fizeram a alegria daqueles cinco jovens patriotas que trabalhavam nas eleições. A começar por um senhor muito bem apessoado, no alto de seus 46 anos, que perguntou a mim onde estavam as cédulas de papel, e onde ele deveria depositá-las depois. Com toda a cordialidade, respondi-lhe que a tecnologia trabalhava em favor de resultados, e que voto em papel era anti-ecológico. Na hora de votar, esqueceu-se do número de seu candidato, e levou dois minutos para encontrar no mural do lado de fora da sala. Pulada essa etapa, lembrou que tinha esquecido de lembrar o número do candidato seguinte, e mais três minutos se foram até que achasse. Ao final da votação, foi aplaudido ironicamente por um idoso que acompanhara toda a cena.

Houve ainda o caso da ‘exuberante senhorita’ que com certo ar de empolgação nos perguntara em voz alta o número de um de seus candidatos. Como procedimento, orientamos a mesma a consultar o painel externo. Na incorrência do terceiro esquecido, que quase teve seus votos alterados por um desavisado eleitor que quase ia votando enquanto o primeiro consultava seu candidato, resolvemos escrever um recado na lousa: ‘Número dos candidatos em mãos’.

O aviso surtiu efeito. Após isso, os desnorteados buscavam a seção eleitoral certa. Sim, muitos eleitores entravam de sala em sala pedindo p/ votar e sempre eram orientados a procurar os representantes do TSE para que lhes dissessem onde deveriam exercer seu dever cívico. O máximo foi a senhora que pediu para votar na minha seção, porque a fila da dela estava enorme.

Ser mesário, no entanto, não é só divertido. Os momentos de ócio são extremamente construtivos e interessantes. Duas mesárias se conheciam, e fofocavam sobre os colegas. As outras duas ficavam ‘tricotando’ sobre assuntos diversos. E eu? Olhava aquele papelão branco na minha frente, e me embebia em devaneios.

Na ausência de uma delas, na hora do almoço, aproveitei para puxar conversa com a que estava agora solitária e igualmente entediada. Foi comendo uma bolachinha de petisco que tivemos uma saborosa conversa sobre queijos, que avançou então até vinhos. E por falar em alimentação, ouvi as mais variadas versões. Inicialmente disseram que mesários recebiam um sanduiche de mortadela. Outros disseram que seriam vales, e me alertaram para a pouca aceitação destes por estabelecimentos alimentícios. Fato é, hoje recebe-se em dinheiro e não há tempo estipulado para o almoço.

Quando criança, acompanhei meu pai em diversas votações e sempre achei um grande evento fazer o ‘x’ decisivo no quadradinho da cédula. Hoje, adulto, me fascino com o sorriso das crianças que acompanham seus pais até a urna, só p/ confirmarem o futuro do nosso país.

E até o segundo turno."

Sem mais

Alexandre Masson